Entenda como este ramo se fortaleceu e sua relação com as indústrias criativas
Por Camila Gabrielle
Comida e criatividade. Essa é uma combinação que tem dado certo, tornando a gastronomia um dos setores que mais cresce no país. Diversos empreendimentos alimentícios têm surgido com diferentes propostas e para todos os públicos, inclusive diabéticos, intolerantes a lactose e veganos, por exemplo.
De acordo com o Instituto Food Service Brasil (IFB), em 2015 o setor alimentício faturou R$ 60 bilhões. Restaurantes e bares são os que mais crescem neste setor.
O Instituto Gastronômico das Américas (IGA) é uma das maiores redes de escolas de gastronomia no mundo e iniciou o primeiro trimestre de 2018 com crescimento de 8% no faturamento em comparação com o mesmo período do ano passado.
De acordo com a instituição, “este crescimento tanto de empreendimentos como de pessoas que estão se profissionalizando na área, indicam o quanto este setor está se fortalecendo, mesmo diante de um cenário de recuperação econômica.”
Com o país tentando se recuperar economicamente, os empreendimentos estão precisando inovar nos cardápios e buscar estratégias para chamar atenção dos clientes.
Indústrias Criativas e Gastronomia
Débora Gonçalves Alencar e Marina Lima dos Santos são mestrandas em Turismo e Desenvolvimento, no Programa de Pós-Graduação em Turismo da Universidade Federal do Paraná (PPGTUR-UFPR).
Débora pesquisa o setor audiovisual e Marina o setor das Cidades Criativas, no qual a criatividade é o motor econômico da cidade contemporânea. Em suas pesquisas, elas intercalam o setor criativo com objetos de pesquisa em casos específicos, como o longa-metragem Estômago (2007) e a cidade de Curitiba.
As pesquisadoras explicam a relação da gastronomia com as indústrias criativas. “A gastronomia é um dos setores que compõem as indústrias criativas, assim como o audiovisual, o artesanato, o teatro, dentre outros. O que todos estes setores possuem em comum é o potencial para a criação de riqueza e empregos por meio da geração e exploração de propriedade intelectual”.
Elas ressaltam também que “na perspectiva da Unesco são setores no qual as atividades relacionadas às tradições culturais estão presentes, e destacando a gastronomia, esse se insere nas expressões culturais tradicionais, uma vez que patrimônio cultural vai além do material, ele possui valor simbólico”.
Dentro deste aspecto da questão simbólica, as pesquisadoras relembram que em 2016, no mapeamento das indústrias criativas no Brasil, elaborado pela Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro (Firjan), o segmento de expressões culturais foi o que apresentou maior expansão no número de empregos formais (2013-2015). Ainda segundo o relatório, o principal fator por trás desse resultado foi o da gastronomia, se consolidando como uma expressão cultural.
Além disso, as pesquisadoras explicaram como programas de reality show sobre culinária contribuíram para a expansão do setor gastronômico. “Os programas de televisão incentivaram quebrando alguns estereótipos, a partir do momento que a cozinha é um espaço tanto feminino quanto masculino, comer não apenas para sobreviver mas como um prazer, um lazer e uma forma de conhecer um local (uma expressão cultural)”.
Chefes que apostam na criatividade
Nesta criação de cardápios variados e inovações nos pratos, os processos de criatividade se afloram. De acordo com Moacir Santana, chefe do Bar da Rosa em Bauru, a montagem do cardápio se liga às experiências. “Normalmente, quando eu vou fazer montagem, eu sempre procuro trazer algo que eu já comi, de experiências de sabores, aromas e tento fazer harmonizações com ingredientes que talvez não sejam daquela determinada receita”, completa ressaltando a importância de trazer o equilíbrio e coerência para o prato.
Além disso, Moacir explica seu processo criativo. “Eu pego base de culinárias ou de algo que eu aprendi durante o processo de trabalhar em restaurantes. Por exemplo, eu tento pegar um abacaxi e harmonizar ele com um coco. Eu imagino o sabor e tento uni-los. No planejamento do cardápio, procuro trabalhar com a fruta ou legume da estação. Se tiver muito frio, colocamos algo mais quente e no calor, algo mais refrescante no cardápio, tanto em drinks, como sobremesa, prato principal ou entrada”.
Além de elaborar deliciosos pratos, para atrair o público, o chefe de cozinha aposta na tecnologia. “Fazemos muitas transmissões ao vivo, eu acho que isso atrai muito. Uso bastante o Facebook. Além disso, gosto bastante de explicar para as pessoas que vou mudar o cardápio, para interação. Às vezes, até os clientes trazem ideias. Eu gosto bastante dessa relação entre clientes e o chefe de cozinha.”
Já Paula Maria de Oliveira é dona do Respect Life, que aposta em doces para pessoas com intolerância à lactose, alérgicos e veganos. A ideia desse projeto surgiu em 2012, da necessidade que Paula sentia em encontrar alguns produtos no mercado vegano.
“Hoje o público vegano está aumentando, mas na época aqui em Bauru era bem poucos os que sabiam o que era. E hoje em 2018, meu público maior não são os veganos mas sim os alérgicos. Descobri um mundo novo, onde o público maior são as crianças e poder transformar a tristeza delas de não poder comer um bolo (doce) em um sorriso doce e cheio de alegria, não tem preço que pague”, argumenta.
Paula aposta em adaptações, versões criativas de um produto não vegano transformando ele em vegano e próprio para alérgicos, de modo geral. “Acreditamos que só de oferecer diversos produtos sem ovo, sem leite, opções sem glúten e soja já seja um grande diferencial. Mas mesmo assim, buscamos sempre aperfeiçoar, pesquisar, criar e adaptar as receitas para que sempre tenham novidades”, ressalta.
Como começar o processo criativo?
Débora e Marina orientam quem deseja se inserir neste mercado e abrir seu próprio negócio. “A inovação se encontra nas facilidades de acesso ao produto. Torne seu produto acessível. Com uma propriedade maior de conhecimento de marketing, nossa linha de pesquisa no mestrado, daria o conselho de segmentar o público logo de início: qual o consumidor do seu produto? A resposta definirá os passos iniciais de forma mais objetiva. Se conseguir interligar com outro setor criativo ou expressão cultural, ótimo. Você tem a possibilidade de maior visibilidade”.
Revisão: João Guilherme